sexta-feira, 27 de agosto de 2010

MEMORIAS DA JUVENTUDE


MEMORIAS DA JUVENTUDE (Sergio de Carvalho) 27/08/2010
Movido a Beatles ,Stones & Contracultura, nos tempos do ginásio chegava cedo na sala de aula antes de todos os alunos, só para escrever furtivamente no quadro negro uma frase altamente perigosa e comprometedora: “Abaixo a Ditadura”...
O professor(a) quando adentrava a sala, ficava silenciosamente alarmado diante daquela atitude audaciosa efetuada no anonimato por algum pupilo seu.
E como recriminar aqueles sonhos inocentes de um mundo pleno de igualdade e fraternidade ?
Prontamente a mensagem era apagada pelo educador (ainda que ideologicamente pensasse da mesma forma ) como se aquela breve frase fosse um terrível mal a ser expurgado e que poderia até mesmo lhe custar o emprego e drástica punição ao aluno rebelde.
Pois bem, quem vivenciou sabe como funcionavam as coisas naquela época onde tudo era suspeito, tudo rigorosamente controlado, vigiado, censurado.
Letras e musicas proibidas aos montes, discos, revistas, zines e livros de conteúdo tido como ameaçadores ao sistema repressor eram combatidos como pragas indesejáveis.
O foco prioritario a ser combatido não era o trafico, mas sim contra quem tivesse uma visão diferente daquelas impostas pelos milicos. Raciocinar, refletir e questionar eram crimes !
Cabeludos de jeans e roupas coloridas, estudantes, escritores, filósofos, músicos, poetas, anarquistas e todos aqueles que de alguma forma fossem pegos propagando mensagens libertarias e de protesto poderiam ser severamente punidos e tirados de circulação.
Lembro de um amigo que foi preso simplesmente por ter um visual hippie, não usava drogas, nunca pegou em arma, nunca roubou, nunca fez qualquer tipo de mal a quem quer que seja; só queria tocar seu instrumento, confeccionar seu artesanato e viver na paz e no amor com tudo e com todos. Certo dia andando na rua, o camburão parou e o jogou na caçamba. Na delegacia cortaram seu cabelo com tesoura de aparar grama ferindo com estupidez e brutalidade sua cabeça e sua alma....felizmente foi solto e continuou firme com o pé na estrada !
Deixando a barra pesada de lado, outras lembranças significativas e essencialmente lúdicas foram das primeiras experiências com as paqueras e namoros. O rapaz quando se interessava pela garota, os referenciais em geral não eram bundas, peitos, músculos, altura, largura, pesos e medidas, nem a grana ou posses materiais , mas sim e principalmente o conteúdo, a sensibilidade, o olhar, as afinidades, os interesses culturais, o bom papo e demais qualidades do caráter que atualmente parecem ter sido relegadas a um museu de sonhadores resistentes.
O ritual que antecedia o namoro era o culto sagrado da paquera. Os interessados invariavelmente depositavam em cartinhas ( cuidadosamente escritas a mão com caneta esferográfica em folhas de caderno) suas declarações de amor . Quando a timidez superava o desejo, solicitava-se algum amigo entregar a missiva, para posteriormente ficar-se aguardando ansiosamente o retorno oral ou igualmente escrito da amada na esperança de receber o sim da conquista consumada.
Havendo interesse recíproco, começava então um conto de fadas de romantismo e paixão:A espera na saída do colégio, o passeio de mãos dadas, os beijos no escurinho do cinema, a expectativa pela aprovação da família; os horários a serem cumpridos para se chegar em casa; a inexperiência sexual a ser testada, os perfumes que passavam de um para o outro, as musicas lentas nas festas e boates que propiciavam danças coladinhas. As aventuras mais ousadas e arriscadas eram os “piços” (sarros) noturnos na penumbra de algum muro na esquina de casa...Amor e Sexo ocupavam um unico e mesmo espaço na vida do jovem casal.

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